quarta-feira, 24 de maio de 2017

ALGORITMO, DATAÍSMO...

Abaixo transcrevo uma das últimas páginas de Homo Deus (2016), de Yuval Noah Harari*:

“Na Babilônia antiga, quando enfrentavam um dilema difícil, as pessoas subiam ao topo do templo local na escuridão da noite e observavam o céu. Os babilônios acreditavam que as estrelas controlam nosso destino e predizem nosso futuro. Observando-as, eles decidiam se casavam, aravam o campo e iam para a guerra. Suas crenças eram traduzidas em procedimentos práticos.
“Religiões baseadas em escrituras, como o judaísmo e o cristianismo, contam uma história diferente. ‘As estão mentindo. Deus, que criou as estrelas, revelou toda a verdade na Bíblia. Então parem de observar as estrelas – em vez disso, leiam a Bíblia.’ Essa também era uma recomendação prática. [...]
“Na sequência, vieram os humanistas, com uma história totalmente nova: ‘Os humanos inventaram Deus, escreveram a Bíblia e agora a interpretam de mil maneiras diferentes. Assim, eles próprios são a fonte de toda a verdade. Você pode ler a Bíblia como uma criação humana inspiradora, mas não é obrigado a isso. Se está diante de um dilema, ouça apenas você mesmo e siga sua voz interior’. O humanismo dava então instruções práticas detalhadas de como ouvir a si mesmo, recomendando ações tais como observar o pôr do sol, ler Goethe, manter um diário particular, ter conversa de coração aberto com um bom amigo e realizar eleições democráticas.
“Durante séculos , os cientistas aceitavam também essas diretrizes humanistas. [...]
[...] “Depois de Darwin, os biólogos começaram a explicar que sentimentos são algoritmos complexos aprimorados pela evolução para ajudar os animais a tomar decisões importantes. Nosso amor, nosso medo ou nossa paixão não são fenômenos espirituais nebulosos que servem apenas para compor poesia. Em vez disso, eles encapsulam milhões de anos de sabedoria prática. Quando você lê a Bíblia, está sendo aconselhado por alguns sacerdotes e rabis que viveram na antiga Jerusalém. Em contrapartida, quando presta atenção a seus sentimentos, está seguindo um algoritmo que a evolução desenvolveu durante milhões de anos. [...]
“No século XXI, no entanto, os sentimentos já não são mais os melhores algoritmos no mundo. Estamos desenvolvendo algoritmos superiores que utilizam um poder computacional inédito e bases de dado gigantescas. Os algoritmos do Google e do Facebook sabem não apenas como você se sente, como sabem 1 milhão de outras coisas a seu respeito. [...] O humanismo ordenava: ‘Ouçam seus sentimentos!’; o dataísmo agora ordena: ‘Ouçam os algoritmos! Eles sabem como você se sente!’.
“’Quer saber quem você realmente é?’, pergunta o dataísmo. ‘Então esqueça as montanhas e os museus. Você já obteve sua sequência de DNA? Não?! Vá e faça isso hoje mesmo.’”
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Yuval Noah Harari nasceu em 1976, em Israel. É autor de Sapiens: Uma breve história da humanidade. É ph.D. em história pela Universidade de Oxford e professor na Universidade Hebraica de Jerusalém. 

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