terça-feira, 13 de dezembro de 2016

FIM DE ROMANCE

A sensação de um vazio começou logo no primeiro dia em que ele ficou sozinho no apartamento com as coisas faltando ou fora do lugar em decorrência da separação. Os furos e marcas nas paredes, lembrança imediata dos quadros, não cessaram de tortura-lo até que os pintores os eliminassem com duas demãos de tinta. Sua única saída era a rua, todavia, assim que abria a porta de volta e não a via ao fundo do corredor (preparando aulas), o vazio voltava a crescer, paradoxalmente feito uma bolha. Uma bolha vazia, diga-se de passagem, que lhe pressionava de dentro para fora, a doer na garganta, a congestionar os olhos, a rasgar a pele da racionalidade (e expor o sentimento vivo que procurara isolá-lo internamente). Após entregar o apartamento, ele retornou para o lugar de sua infância, com a perspectiva de que o vazio se preenchesse de alguma forma inexplicável. As poucas coisas que restaram do antigo lar, simples como um pote de temperos identificado por ela, os travesseiros ou o par de chinelos que ganhara de aniversário, todavia, acionavam um estado de intensa suscetibilidade emotiva, muito difícil de esconder daqueles que o cercavam na nova casa. Toda vez que retornava à cidade, via-se em frente ao edifício em que morara, a olhar para as janelas do apartamento com a ideia quase obsessiva de vê-la de repente. Certa noite, depois de rodar pela cidade sem destino, estacionou o carro na esquina em frente, para permitir que a bolha explodisse inexplicavelmente. Dentro do carro, ouvindo as músicas que ouviam em suas viagens, ele continua a sentir o vazio com uma tristeza sempre renovada, a se perguntar se ela não sentia algo também, ao ouvir as mesmas músicas. A semana que vem, ele tem uma viagem marcada (de acordo com o que haviam planejado antes da separação). Agora irá sozinho, ouvindo as músicas que ouviam juntos. Certamente, o vazio crescerá dentro dele, na medida em que estará vazio o lugar que ela ocupava ao seu lado. Depois dessa viagem, talvez faça outra com destino incerto, outra mais e mais outra. Mesmo indo para Pasárgada, não será feliz inteiramente, porque há de persistir o vazio criado pela ausência dela. 

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