segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

POR AONDE?

O vento prenuncia chuva para logo. Ele se faz ouvir no farfalho enlouquecido das ramagens. Uma encruzilhada teima em se desenhar à minha frente, com perspectivas obliteradas pela minha dúvida. Não posso retornar tampouco, na medida em que a vida é uma estrada de sentido único. Meu tempo se constitui com a necessidade de ocupar novos pontos no espaço, seguir adiante. Neste momento, vou por aonde? A viagem há pouco realizada não foi suficiente para determinar um norte, malgrado indo para o sul. Talvez siga para o norte. Talvez. A chuva, prestes a cair, deverá apagar minhas pegadas.

domingo, 25 de dezembro de 2016

COMENTÁRIOS DIVERSOS

O pessoal fala muito em deus, deus pra cá, deus pra lá, mas não vejo foto dele (ou de seu único representante encarnado).
Não faltam fotos de comida, muita comida, muita bebida, muitas selfies, muitas mensagens bobas.
O Natal se seculariza, pelos hábitos daqueles que se dizem religiosos.

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O NATAL foi introduzido no Cristianismo pela Igreja Católica, a partir de uma festa sabidamente pagã. A data hoje continua repleta de paganismos, como a figura do Papai Noel. O consumismo enlouquecido associado ao espírito natalino, mais que os elementos pagãos, e o processo de secularização serão responsáveis pelo fim da religiosidade que subsiste ainda no Natal.

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O Uruguai é o país mais adiantado da América Latina, mais educado, mais seguro. IDH mais alto. Apresenta o maior índice de ateus, o que prova ser a moralidade anterior à religião, independente desta. Para responder à preocupação de um personagem de OS IRMÃOS KARÁMAZOV, de Dostoievski, sem deus tudo é possível, óbvio, inclusive a ordem, a decência humana. O Brasil é preponderantemente religioso e...

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HÁ UM PROCESSO CIVILIZACIONAL em curso no Ocidente: a secularização. O que é a secularização? É a transformação ou passagem de coisas, fatos, pessoas, crenças e instituições, que estavam sob o domínio religioso, para o regime leigo. Esse processo é irreversível, mas as religiões se agarram em seus esteios dogmáticos (fixos no sobrenatural).

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

FIM DE ROMANCE

A sensação de um vazio começou logo no primeiro dia em que ele ficou sozinho no apartamento com as coisas faltando ou fora do lugar em decorrência da separação. Os furos e marcas nas paredes, lembrança imediata dos quadros, não cessaram de tortura-lo até que os pintores os eliminassem com duas demãos de tinta. Sua única saída era a rua, todavia, assim que abria a porta de volta e não a via ao fundo do corredor (preparando aulas), o vazio voltava a crescer, paradoxalmente feito uma bolha. Uma bolha vazia, diga-se de passagem, que lhe pressionava de dentro para fora, a doer na garganta, a congestionar os olhos, a rasgar a pele da racionalidade (e expor o sentimento vivo que procurara isolá-lo internamente). Após entregar o apartamento, ele retornou para o lugar de sua infância, com a perspectiva de que o vazio se preenchesse de alguma forma inexplicável. As poucas coisas que restaram do antigo lar, simples como um pote de temperos identificado por ela, os travesseiros ou o par de chinelos que ganhara de aniversário, todavia, acionavam um estado de intensa suscetibilidade emotiva, muito difícil de esconder daqueles que o cercavam na nova casa. Toda vez que retornava à cidade, via-se em frente ao edifício em que morara, a olhar para as janelas do apartamento com a ideia quase obsessiva de vê-la de repente. Certa noite, depois de rodar pela cidade sem destino, estacionou o carro na esquina em frente, para permitir que a bolha explodisse inexplicavelmente. Dentro do carro, ouvindo as músicas que ouviam em suas viagens, ele continua a sentir o vazio com uma tristeza sempre renovada, a se perguntar se ela não sentia algo também, ao ouvir as mesmas músicas. A semana que vem, ele tem uma viagem marcada (de acordo com o que haviam planejado antes da separação). Agora irá sozinho, ouvindo as músicas que ouviam juntos. Certamente, o vazio crescerá dentro dele, na medida em que estará vazio o lugar que ela ocupava ao seu lado. Depois dessa viagem, talvez faça outra com destino incerto, outra mais e mais outra. Mesmo indo para Pasárgada, não será feliz inteiramente, porque há de persistir o vazio criado pela ausência dela.