segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

CASOS DE FÉ (V)

O criacionismo ganhou uma variante pós-moderna, cujo mito fundador requer estatuto de ciência: a Ufologia. Alguns visionários creem que seres extraterrestres, superinteligentes, visitavam os homens no passado, com o fito de instruí-los em novas tecnologias. Zecharia Sitchin radicaliza essa influência, atribuindo aos nifilim (habitantes de um planeta que orbitaria o Sistema Solar a cada 3.600 anos) a própria criação do homo sapiens moderno.
A legião de seguidores a repercutir essas ideias estapafúrdias aumenta assustadoramente, à medida que os mitos antigos não resistem à desconstrução filosófica e científica. Dez religiões surgiram no último século, para celebrar os UFOs e seus tripulantes imaginários.
Ao longo de treze anos, tive um colega de trabalho que sabia O 12º planeta de traz para frente. Ele citava o primeiro enunciado do livro de Sitchin como axioma basilar, a partir do qual justificava sua fé: “o homem moderno é um estranho à Terra”.
Entre parêntesis: fé se distingue de convicção, uma vez que independe de provas, até mesmo de provas contrárias.
As conversas entabuladas por nós dois tinham início e término em torno da premissa acima, cuja presunção de verdade contradiz o evolucionismo gradual e cumulativo.
Eis o argumento de Sitchin:
"[…] súbita e inexplicavelmente, há 35.000 anos, uma nova raça de homens – homo sapiens (o “homem pensante”) – apareceu como vinda do nada e varreu o Homem de Neandertal da face da Terra". 
Meu interlocutor repetia o equívoco de seu mestre (que era um estudioso de Arqueologia). A propósito, a dificuldade em conceber o tempo passado constitui uma das limitações do nosso cérebro, deveras ocupado em processar milhões de informações do tempo presente.
Sitchin estabelece uma divisão evolutiva para o homem, ocorrida há 35.000 anos, que não houve. Análises recentes de pinturas rupestres asseguram que tais ocorreram de cinco a dez mil anos antes da data acima estipulada para o surgimento do Homem de Cro-Magnon. Nesse aspecto, Sitchin se assemelha a Erich von Daniken, acusado de fraude na produção de Eram os deuses astronautas?
A expressão “súbita e inexplicavelmente” escancara um reducionismo enganador, com que Sitchin ignora dezenas, centenas de milhares de anos. A “revolução cognitiva”, para seu governo, iniciou-se entre 70.000 e 100.000 mil anos atrás, com a descoberta do uso de símbolos pelos humanos.
A hipótese central de O 12º planeta é de que o homo sapiens moderno resultou de uma melhoria genética, conduzida pelos nifilim. Óvulos de fêmeas antropoides foram fertilizados com espermatozoides de extraterrestres. Manipulação genética interplanetária, ora!
Meu colega não me respondia por que o DNA do homem moderno e o do chimpanzé apresenta uma diferença de apenas 0,6%. A variação de ordem cromossômica que deu origem às duas espécies, sabemos agora, aconteceu entre seis e sete milhões de anos AP. A molécula de DNA, o replicador mais importante para a vida no planeta, tem uma história superior a três bilhões de anos.
Toda vez que lhe fazia alguns questionamentos como esse, meu interlocutor tergiversava (à maneira dos criacionistas cristãos). 

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