sábado, 12 de dezembro de 2015

CASO DE FÉ (VII)

Cedo ou tarde, o católico não praticante ou insatisfeito com a ortodoxia põe os olhos e as mãos num livro até então desconhecido: O evangelho segundo o espiritismo. A partir da leitura das primeiras páginas, ele se vê cerebralmente envolvido pelo ardil discursivo de Denizard Hipolyte Léon Rivail (Allan Kardec).
O espiritismo parasitou o campo conceitual judaico-cristão, com o fito de parecer autêntico e atrair adeptos. Repito, adeptos egressos do catolicismo. Os evangélicos, cuja denominação não é meramente cognática, são mais fiéis aos evangelhos. E os judeus, à lei mosaica.
Não me interessam as influências da maçonaria e do positivismo no construto teórico de Kardec. Meu objetivo inicial é destacar a maior contradição da doutrina espírita em relação aos Evangelhos: a reencarnação.
Os quatro evangelistas primordiais narram sobre a ressurreição de Jesus (Mt 20.1-10; Mc 16.1-8; Lc 24.1-12; e Jo 20.1-10). O assunto é esmiuçado por Paulo de Tarso em sua Primeira Carta aos coríntios (15.4-19): “E, se não há ressurreição de mortos, então, Cristo não ressuscitou… E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé”.  
A reencarnação prega que a alma passa por várias existências corporais, “depois de deixar um corpo toma outro”, para o seu “aprimoramento progressivo”. É exatamente isso o que está escrito nO livro dos espíritos, capítulo IV, sobre a “Pluralidade das existências”. Neste aspecto, o espiritismo constitui uma ordem teleológica, que aposta na evolução do espírito em direção à perfeição. Não compreendo por que o espírito necessita do aporte material, para evoluir numa dimensão outra, que não a dominada pelo corpo, pelos instintos abomináveis.
O mesmo fato que sustenta a ressurreição, o desaparecimento do corpo de Jesus do túmulo em que fora sepultado, denega a reencarnação. Da mesma forma, Hebreus 9.27: “Aos homens está destinado morrerem uma só vez, vindo, depois disso, o juízo”. 
A ressurreição em três dias se justifica miticamente, porque aconteceu a Jesus, filho de Deus e Deus (a um tempo). Esse caso excepcional apenas aumenta a fé dos cristãos praticantes, que continuarão a esperar pela realização do mito até o fim dos tempos.
Para mim, neoateu, ressurreição e reencarnação são como que variações de um mesmo tema – a vida além da vida. A imortalidade é o sonho do homem. Não há mal sonhar esse sonho, exceto que, para sonhá-lo, é necesário transformar a vida real num pesadelo.
Antes do cristianismo, Sócrates e Platão haviam condenado os sentidos. Depois de Cristo, Paulo de Tarso, Santo Agostinho, a igreja católica, a reforma protestante, a metafísica moderna e Denizard Rivail, com a sua doutrina espírita, tentaram fazer deste mundo uma ilusão, um “vale de lágrimas, um lugar de dor, de pecado e de expiação.
       Definitivamente, necessitamos de uma ordem secular.

Nenhum comentário: