sábado, 31 de outubro de 2015

SUICÍDIO (SEGUNDO CAMUS)

A primeira coisa que ouço alguém dizer depois da ocorrência de um suicídio em Santiago é que há algo de misterioso em nosso município, que o coloca no topo de um ranking muito triste.
No momento, em consideração ao meu interlocutor, não faço qualquer comentário contra seu preconceito. Fico na vontade, refletindo mais tempo sobre o assunto.
Em O mito de Sísifo, Albert Camus produz o seguinte parágrafo com rasgos de genialidade:
"O suicídio sempre foi tratado somente como um fenômeno social. Ao invés disso, aqui se trata, para começar, da relação entre o pensamento individual e o suicídio. Um gesto como este se prepara no silêncio do coração, da mesma forma que uma grande obra. O próprio homem o ignora. Uma tarde, ele dá um tiro ou um mergulho. De um administrador de imóveis que tinha se matado, me disseram um dia que ele perdera a filha há cinco anos, que ele mudara muito com isso e que essa história 'o havia minado'. Não se pode desejar palavra mais exata. Começar a pensar é começar a ser minado. A sociedade não tem muito a ver com esses começos. O verme se acha no coração do homem. É ali que é preciso procurá-lo. É preciso seguir e compreender esse jogo mortal que arrasta a lucidez em face da existência à evasão para fora da luz".
A reflexão camuniana beira a poesia, no estilo que apenas os gênios desenvolveram para se acercar da verdade.  

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