segunda-feira, 9 de maio de 2011

O FATOR HUMANO

James Lovelock é um dos grandes pensadores vivos do nosso tempo, mestre do saudoso José Lutzenberger. O ecologista inglês criou o conceito de Gaia para designar o planeta Terra como um ser vivo. Sua ideia (um tanto revolucionária) é de que a biosfera tem a capacidade de controlar o ambiente natural, química e fisicamente. ANtes de ter lido Lovelock, escrevi um texto que atribui vida aos rios. Uma figura de linguagem (metonímia) permitiu-me dizer que os rios vivem pela fauna e flora neles existentes. O tema do meu artigo: as cidades são o câncer dos rios. Os cursos de água antecedem toda aglomeração humana, como artérias que vivificam o que chamamos de natureza. Reconheço que é necessário um espírito elevado de desprendimento para fazer esta crítica sem o viés antropocêntrico, livre do preconceito religioso que subordina tudo o que há ao homem. Preconceituosamente, justifica-se uma descrição do tipo "o Tâmisa atravessa Londres", o Tietê atravessa São Paulo", o arroio Dilúvio atravessa Porto Alegre". Essas cidades é que atravessaram, aliás, atravancaram-se nos rios, entupindo-os com suas pútridas e venenosas cloacas. Outra figura (metáfora) possbilita-me comparar o fator humano à infestação de um vírus, não apenas em relação aos rios, lagos, mares e oceanos, mas tambem a todo o meio ambiente, desde as camadas subterrâneas (com extração de petróleo, água e outros minerais) à estratosfera (com a emissão de gases nocivos e a destruição de outros gases favoráveis à Gaia). Nada escapa à ação virulenta de bilhões de indivíduos. Para nossa sobrevivência, assassinaremos a vida. [...] Lovelock não tem esta visão catastrofista. Ele inocentou o homem, incluindo-o entre os agentes naturais de poluição incapazes de alterar profundamente o clima na Terra. Sábio e bondoso, Lovelock. 
(Há seis anos, escrevi esse texto para a coluna do Expresso Ilustrado. Estou pensando em reunir as melhores colunas num livro.)

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