segunda-feira, 1 de novembro de 2010

CARLOS PENA FILHO

A oficina de poesia que estou orientando no Centro Cultural me exige muito estudo. Com isso, passo a conhecer certos detalhes da nossa literatura que  desconhecia (em razão dos livros didáticos constituírem sempre uma amostra superficial do que se destaca no amplo cenário brasileiro). Pesquisando sobre estrofes isométricas, isto é, com versos de mesma medida, cheguei ao nome de  Carlos Pena Filho (Recife, 1929 - 1960), um dos mais importantes poetas pernambucanos depois de João Cabral de Melo Neto. Logo me identifiquei com a sua poesia, com forte apelo pictórico, especialmente pela cor azul. Destaco os sonetos:
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Para fazer um soneto
Tome um pouco de azul, se a tarde é clara,
E espere um instante ocasional
Neste curto intervalo Deus prepara
E lhe oferta a palavra inicial

Ai, adote uma atitude avara
Se você preferir a cor local
Não use mais que o sol da sua cara
E um pedaço de fundo de quintal

Se não procure o cinza e esta vagueza
Das lembranças da infância, e não se apresse
Antes, deixe levá-lo a correnteza

Mas ao chegar ao ponto em que se tece
Dentro da escuridão a vã certeza
Ponha tudo de lado e então comece.
. 
Desmantelo Azul  
Então pintei de azul os meus sapatos
por não poder de azul pintar as ruas
depois vesti meus gestos insensatos
e colori as minhas mãos e as tuas
. 
Para extinguir de nós o azul ausente
e aprisionar o azul nas coisas gratas
Enfim, nós derramamos simplesmente
azul sobre os vestidos e as gravatas
.
E afogados em nós nem nos lembramos
que no excesso que havia em nosso espaço
pudesse haver de azul também cansaço
.
E perdidos no azul nos contemplamos
e vimos que entre nascia um sul
vertiginosamente azul: azul.

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