terça-feira, 12 de janeiro de 2010

DEFEITO ORIGINAL DOS FILÓSOFOS


"Todos os filósofos têm em seu ativo este defeito comum de partir do homem atual e pensam, fazendo uma análise do mesmo, chegar ao objetivo. Involuntariamente "o homem" lhes aparece como uma aeterna veritas, como um elemento estável no meio de todos os turbilhões, como uma medida segura das coisas. Mas tudo o que o filósofo enuncia sobre o homem nada mais é, no fundo, que um testemunho sobre o homem num espaço de tempo muito limitado. A falta de sentido histórico é o defeito original de todos os filósofos; alguns até tomam, sem se darem conta, a mais recente configuração do homem, tal como se produziu sob a influência de determinadas religiões ou mesmo de determinados acontecimentos políticos, como a forma fixa, da qual é preciso partir. Não querem aprender que o homem evoluiu, que a faculdade de conhecer também evoluiu; enquanto alguns deles até se permitem construir o mundo inteiro a partir dessa faculdade de conhecer. (...) Ora, todo o essencial da evolução humana se produziu em tempos remotos, muito antes desses quatro mil anos aproximadamente que conhecemos; nestes, o homem já não pode ter mudado muito. Mas o filósofo vê "instintos" no homem atual e supõe que estes instintos façam parte dos dados imutáveis da humanidade e, a partir disso, podem fornecer uma chave para a compreensão do mundo em geral; toda a teleologia esta edificada sobre isso, de modo que se fala do homem dos últimos quatro mil anos como de um homem eterno, com o qual todas as coisas do mundo têm, desde seu início, uma relação natural. Mas tudo evoluiu; não há realidades eternas: tal como não há verdades absolutas. Por conseguinte, a filosofia histórica é doravante uma necessidade e, com ela, a virtude da modéstia."
Do livro Humano, demasiado humano, de F. Nietzsche.
Já escrevi um texto muito parecido, sem especificar que seriam os filósofos os equivocados, mas a maioria dos homens.

Nenhum comentário: