quinta-feira, 30 de abril de 2009

DOIS NIETZSCHE


Em Sobre Zaratustra, Max Zerbst escreve que há dois Nietzsche:
"Um é o mundialmente famoso 'filósofo em moda', o brilhante poeta e mestre soberano da língua e do estilo, de quem todos falam na atualidade e em cuja obra algumas frases de efeito mal-compreendidas se transformam em duvidoso patrimônio comum das pessoas 'cultivadas'. O outro Nietzsche é o pensador e psicólogo insondável, inesgotável, o grande escrutados dos homens e juiz dos valores da vida, de uma capacidade espiritual e uma potência intelectual inigualada, a quem pertence o futuro mais longínquo."
Zerbst justifica seu livro como uma tentativa de aproximar do segundo Nietzsche os homens perspicazes e sérios de nosso tempo. (Do livro Minima Moralia, de Theodor Adorno.)

Nos últimos dez anos, evoluo de uma fase (de admiração) do primeiro Nietzsche para outra (de compreensão) do segundo. A poesia me levou ao nietzschismo apaixonado a partir do prólogo de Assim falou Zaratustra. A filosofia, por sua vez, obrigou-me a uma releitura de Nietzsche, vindo a compreender suas ideias principais, como a que perpassa suas obras: a nefasta influência da tradição judaico-cristã na sociedade ocidental.
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quarta-feira, 29 de abril de 2009

LANÇAMENTO DE ANTOLOGIA

Recebi o convite da Academia Santa-Mariense de Letras, que lançará seu livro Academia em prosa e verso na Feira do Livro de Santa Maria, Praça Saldanha Marinho, dia 6 de maio de 2009.
Caro autor:
Em especial, estou encaminhando aos Sócios Correspondentes, o Convite para o lançamento de nosso novo livro (240 páginas) da ASL! Na medida do possível, repassem-no para os amigos ligados à cultura e venham para autografar na Praça. Como é patrocinado pela LIC, o livro não é pago, por isso, criteriosamente distribuído, com as pessoas e entidades que o receberem deixando seus nomes por escrito. Além da presença, esperamos, portanto, que também nos ajudem a divulgar o evento, que deverá ser muito lindo.

Um abraço acadêmico e fraterno da
Lígia Militz


terça-feira, 28 de abril de 2009

DIA DO TRABALHO (ORIGEM)

Como a próxima edição do Expresso Ilustrado coincide com o Dia do Trabalho, estava pensando escrever sobre a razão dessa data multinacional. O primeiro passo foi pesquisar na Internet, uma vez que doara minha enciclopédia ao colégio Ludovina Portocarrero, em Forte Coimbra. A palavra "trabalho" se origina etimologicamente do latim "tripaliu", que denominava um instrumento de tortura formado por três paus. Apenas no século XIV, o termo passou a designar o que conhecemos hoje por trabalho. Ainda é possível observar algumas atividades, como na agricultura, por exemplo, em que o esforço e o desgaste físicos castigam muito mais o indivíduo que o tripaliu. Não estou me referindo ao trabalho livre, por razões óbvias. Recentemente, os escravos trabalhavam e eram açoitados no tronco (pau único). O passo seguinte: buscar o porquê do Dia do Trabalho. Não abro mão de um paradigma nietzscheano: o estudo genealógico (que é a "investigação da história com o objetivo de identificar as relações de poder que deram origem a ideias, valores ou crenças", segundo o Houaiss). Outra vez me deparo com um fato desagradável, de sofrimento e morte. No ano de 1886, houve um dos primeiros protestos de trabalhadores em Chicago, o qual acabou em massacre daqueles que eram muito mais fracos na relação de forças com a polícia, com os empregadores, com o Estado. Mais uma vez, sou obrigado a citar Nietzsche, que se manifestou (esqueci em qual livro) sobre essa tendência da civilização ocidental, bastante condicionada pela tradição judaico-cristã, de deixar-se impregnar mais facilmente pelo sangue. No Velho Testamento, mais precisamente no Gênesis (genesíaco, genealogia), a mítica humana principia com um fratricídio, de uma violência que somente agora passou a macular a realidade. No Novo Testamento, então, o sacrifício de Jesus, sob o aspecto que Freud denominou de "pulsão de morte" (tânatos), prestou-se para transformar a cruz num dos símbolos máximos da cristandade. No último livro da Bíblia, mais precisamente em Apocalipse (16:14,16), o fim da experiência humana na Terra, o Armagedom, é descrito de acordo com essa inclinação que faz apologia ao sangue derramado, à morte, a tudo que denega a vida, sua força e sua alegria. Por isso nossos santos e nossos heróis foram, ou aqueles que morreram nas mãos de assassinos, ou aqueles que mataram os inimigos. O feriado de Tiradentes assemelha-se à Sexta-feira Santa. O Dia do Trabalho, por sua origem, assemelha-se ao Dia da Mulher. O Vinte de Setembro...

segunda-feira, 27 de abril de 2009

AGRESSIVO E EFICIENTE

A humanidade, a despeito de sua excelsitude, não está a salvo de uma possível extinção. Isto mesmo! Se até o presente, por um preconceito especista que a coloca no centro da criação, pensou na extinção de outras espécies (com a sua participação em muitos casos), já é chegada a hora de vislumbrar o próprio fim. Para essa possibilidade concorre o aquecimento global a longo prazo. A queda de um meteoro gigantesco não pode ser descartada como real, sem o controle conseguido na última hora pelos heróis da ficção científica ou do cinema. Mas a pior ameaça, inopinada e de curto prazo, é representada pelo vírus (tão agressivo e eficiente quanto tem sido o homem).

domingo, 26 de abril de 2009

MINIMA MORALIA

Após a postagem abaixo, vou à estante e apanho Minima moralia, de Theodor Adorno, e o abro à revelia. Página 84, fragmento 61, o qual transcrevo a seguir:
Instância de apelação. - Nietzsche formulou no "Anticristo" o mais forte argumento não só contra a teologia, mas também contra a metafísica; que a esperança seria confundida coma verdade; que a impossibilidade de viver feliz ou mesmo simplesmente de viver, sem pensar em um absoluto não atesta a legitimidade de tal pensamento. Ele refuta a "prova pela força" do cristianismo, de que a fé é verdadeira porque traz a beatitude. Pois, "seria a beatitude - ou dito de um modo mais técnico, o prazer - uma prova da verdade? Ela o é tão pouco, que quase fornece uma prova contrária, ou em todo caso permite levantar a maior suspeita contra a 'verdade', quando sensações de prazer têm algo a dizer acerca da questão 'O que é verdadeiro?'.
No mesmo fragmento, Adorno conclui:
Nietzsche moveu todo um processo sem jamais ter atingido a última instância. Numa das passagens mais vigorosas de sua crítica, ele acusou o cristianismo de mitologia: "O sacrifício expiatório, e na sua forma mais repugnante, mais bárbara, o sacrifício do inocente pelos pecados dos culpados! Que paganismo horrendo!".

MARCOS ROLIM

A edição do Zero Hora deste domingo foi salva pela coluna do Marcos Rolim: O som nosso de cada dia. De acordo com o que Cláudia Laitano propôs ontem, Rolim cita Adorno e Nietzsche (como argumento de autoridade). O primeiro (que também cita Nietzsche), da Escola de Frankfurt, "sustentou que o predomínio da indústria cultural na música - aquela orientada para a venda e não para a qualidade - produzia o que ele chamou de regressão da audição". Depois de uma série de considerações, Rolim escreve: "O problema é que o mau gosto vem sempre em alto volume... Mudo de opinião no dia em que um carro desses transformados em amplificador parar no sinal, ao meu lado, tocando a Nona Sinfonia... Por que é preciso tolerar que o espaço público seja colonizado pelo 'gosto' de um ou outro indivíduo que, em total desprezo pelas pessoas que por ali transitam, empurra sobre todos aquilo que ele chama de 'música'?". O segundo citado, Nietzsche (a vida seria um erro sem a música), caso vivesse hoje, "teria se transformado em um serial killer", brinca Rolim.

sábado, 25 de abril de 2009

CLÁUDIA LAITANO


No Zero Hora deste sábado, Cláudia Laitano externa a seguinte opinião:
Um jornal ideal, além de cronistas esportivos e do analista econômico, deveria contar com um colunista diário de assuntos filosóficos, alguém que nos ajudasse a entender, à luz do que os grandes pensadores já escreveram sobre o assunto, por que tanta gente, famosos e anônimos, ricos e pobres, pós-graduados e analfabetos, tem dificuldade de distinguir o certo e o errado.
Uma pena que a jornalista não tenha lido o Expresso Ilustrado de ontem, encontrando a prova de que o idealizado por ela já existe há seis anos. Meu texto Os ídolos de Bacon (também postado abaixo) constitui um exemplo perfeito de sua proposta.

FOLHAS DE OUTONO

O lançamento de Folhas de outono, do Cácio Machado da Silva, aconteceu nessa sexta-feira, no Centro Cultural. O espaço ficou pequeno para abrigar todas as pessoas que compareceram ao evento. O protocolo (conduzido pela Profª Simone), o coquetel e sessão de autógrafos, tudo perfeito. Uma noite especial.
Minha participação no lançamento:
O poeta historia um tempo que começa na infância e continua futuro afora, no sonho e na imaginação. O gênero que produz constitui o registro de suas percepções, de seus sentimentos... Pelo menos, é isso o que se depreende da poesia do Cácio Machado. No seu livro de estreia, o poeta abriu um baú na memória, de onde voaram as lembranças como pássaros amestrados. Em Dias de sol e vento, há um guri contumaz em se apoderar do discurso, para falar de essências de saudade, dos cheiros do pão de fôrma, dos temperos, da grama, do vento antes e depois da chuva... Isto é preciso destacar: o eu-lírico (sinestésico) amalgama sensações olfativas, visuais, táteis, auditivas... Outro predicado com que o sujeito faz a sua enunciação diz respeito à oralidade, que a transposição da fala cotidiana, com seu ritmo natural, espontâneo. O próprio autor tem consciência dessa qualidade, ao dedicar seu Folhas de outono "Aos poetas analfabetos que viveram em poesia e não puderam deixar uma só linha de suas maravilhas". Nesse livro, mantida é a característica discursiva daquele, textualizada na epígrafe e na introdução, em que o Cácio cita um professor (el arte es siempre arte sobre el arte) e escreve que "Folhas de outono segue o rastro simples de Dias de sol e vento". O vento que fez soprar em dias de sol ainda sopra para sustentar a pandorga e para apanhar suavemente as sazonadas folhas de outono. [...] A arte, ou se detém nos seus elementos formais, intrínsecos à palavra, ao verso e ao poema, ou privilegia o conteúdo, como passou a caracterizar a produção poética a partir de 1922. Ainda que sem descuidar dos significantes, Folhas de outono é significado, mesagem, diálogo entre o Cácio e seu eu íntimo; entre o eu-lírico e uma segunda pessoa, ora presente, ora distante; entre o autor e o leitor. Em meio a esse jogo enunciatório é possível identificar certas epifanias, que significam apreensão quase intuitiva da realidade por meio de algo geralmente simples e inesperado. [...] Folhas de outono é... um fruto extemporâneo, cujo sabor posso lhes adiantar, é de uma doçura...

quinta-feira, 23 de abril de 2009

W.S.

Apenas no meu calendário, hoje é um dos dias do ano em que a poesia merece ser lembrada. Alguém que lê esta postagem sabe a justificativa que me leva a escrever isso? Visito o blog da Lígia Rosso*, na certeza de encontrar algo que me ajude, mas retorno a esta janela (janelinha, janelão) seguro de que nossa blogosfera prefere outros assuntos à poesia. Dia desses, recebi um comentário de quem não aguentava mais minhas considerações metapoéticas. Não o publiquei por uma questão de coerência: o comentário era anônimo (ainda que educado, sério). Em 23 de abril, nasceu um dos maiores poetas da humanidade, que nasceu numa pequena cidade da Inglaterra, chamada Stratford-Avon. Coincidentemente, o autor de 154 sonetos e 38 peças teatrais morreu em 23 de abril, na mesma Stratford-Avon. Dele, Voltaire escreveu que não passou de um bárbaro que compôs "monstruosas farsas e tragédias", e Lord Shaftesbury disse ser "um espírito selvagem e grosseiro". Segundo Will Durant, o mundo inteiro sabe de como esse homem se "casou às pressas e se arrependeu demoradamente; como fugiu para Londres, se fez ator, refez a seu modo velhas peças, e concluiu, com Kit Marlowe que todas as coisas são melhores de caçar do que de gozar; como esgrimiu com agudeza contra Chapman e Bem Jonson na taverna da Sereia; como declarou guerra aos puritanos incipientes e os desafiou com alegria; como leu Plutarco, Froissart e Holinshed e aprendeu história, como estudou Montaigne e aprendeu filosofia; como afinal, por meio do estudo, do sofrimento e dos desastres, se tornou o Guilherme, o Conquistador dos teatrólogos do seu tempo e passou desde então a governar o mundo que fala inglês". Durant continua, com seu estilo vibrante: "O que nele mais gostamos é a loucura e a riqueza do seu falar. Tem o estilo da vida que levava, pleno de energia, tumulto, cor e excesso... Estilo às carreiras, sem fôlego... Nunca emendou uma linha, nem corrigiu provas; a suposição de que no futuro suas peças seriam antes lidas do que representadas jamais lhe ocorreu. Descuidado do porvir, escreveu com o fogo da paixão. Palavras, imagens, frases e ideias lhe vinham numa inexaurível torrente... Homem nenhum dominou tanto uma língua, nem usou-a com maior prodigalidade... Sim, seus enredos são impossíveis, como o notou Tolstoi; os equívocos são pueris, os erros são legião, e a filosofia é de renúncia e desespero. Nada importa. O que importa é que em cada página fulgure a divina energia da alma - e isto nos faz perdoar tudo a um homem. A vida está além da crítica - e WILLIAM SHAKESPEARE é mais vivo que a vida".

* A Lígia é a pessoa que mais gosta de Shakespeare em Santiago. Competente professora de inglês, ela foi minha colega no pós-graduação de Leitura, Análise, Produção e Reescrita Textual.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

A ARTE DA VIDA


Hoje recebi o livro A arte da vida, de Zygmunt Bauman, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009. Li as 25 páginas da Introdução num só fôlego. “O que há de errado com a felicidade?”, pergunta-nos o sociólogo polonês. Inicialmente, o autor questiona a correlação entre crescimento econômico e maior felicidade. Cita relatórios de pesquisa examinados por Michael Rustin, que conclui não haver aumento do bem-estar subjetivo com a melhora nos padrões de vida em nações como Estados Unidos e Grã-Bretanha. Noutros países, embora os índices de satisfação cresçam com o nível do PNB, “eles só crescem de modo significativo até o ponto em que carência e pobreza dão lugar à satisfação das necessidades essenciais, de sobrevivência”. Bauman é enfático: “Metade dos bens cruciais para a felicidade humana não tem preço de mercado nem pode ser adquirida em lojas”. Como exemplo, ele enumera o amor, a amizade, os prazeres da vida doméstica, a satisfação que vem de cuidar dos entes queridos ou de ajudar um vizinho em dificuldade, a autoestima proveniente do trabalho bem feito, o reconhecimento, a simpatia e o respeito dos colegas, entre outros bens não-comerciais. O mercado tudo faz para desenvolver “a crença de que há um vínculo íntimo entre a felicidade e o volume e quantidade de consumo”.

terça-feira, 21 de abril de 2009

TIRADENTES


Tiradentes é um autêntico herói nacional, porque lutava por uma nação livre quando era crime falar em independência. Um herói trágico, visto que foi morto pelo poder maior contra o qual digladiava. Sua história lembra a de Prometeu, desobedecendo aos deuses ao usurpar-lhes o fogo do Olimpo, entregando aos humanos. Diferente de Aquiles, vencido pelo destino, o titã pode ser considerado o primeiro herói engendrado mitologicamente. Tiradentes lembra Joana D'Arc, condenada por heresia. Lembra Giordano Bruno, também queimado na fogueira. No caminho de todo herói quase sempre se interpõe uma força invencível, seja a natureza, os deuses/ demônios, o Estado, a Igreja... A heroicidade é confirmada a posteriori, quando as causas pelas quais o (futuro) herói lutava se tornam vencedoras. Com o fogo da razão, os homens sobreviveram aos deuses. A França recuperou seus territórios, e o processo contra Joana D'Arc foi revisto. As idéias de Copérnico, com as correções de Kepler e de Galileu, acabaram derrubando o geocentrismo dogmatizado pela Igreja de Roma. A nação brasileira, idealizada pelos inconfidentes, tornou-se livre do jugo colonial.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

ÍDOLOS DE BACON

Uma das páginas mais brilhantes da Filosofia foi produzida por Francis Bacon, empirista inglês que rompeu com uma tradição de dois mil anos. O conhecimento filosófico, ao longo desse tempo, ou se restringia a repetir Aristóteles, ou se teologizava a partir das igrejas e mosteiros católicos. Bacon foi o primeiro a se dar conta que nenhum outro conhecimento evoluiria sem um expurgo do intelecto, o qual se encontrava viciado em erros diversos. Esses erros eram de quatro tipos, que o pensador chamou de “ídolos”. Ídolos da Tribo: a tribo humana vê as coisas com olhos que as deformam antropomórfica e antropocentricamente. A humanidade tinha a Terra como centro do Sistema Solar, ao se colocar como referência, no centro. Ídolos da Caverna: são enganos peculiares a cada indivíduo, que vê tudo a sua volta como se estivesse dentro de uma caverna, representada pelo seu modo de ser, por sua disposição de corpo e de espírito. Ídolos do Mercado (ou foro): erros gerados pela ambiguidade das palavras, pela falta de comunicação entre os homens. Muitas vezes, de meras abstrações, os nomes passam por coisas, seres e fenômenos tangíveis. Os filósofos (ou teólogos?) elucubram sobre a “primeira causa não causada” ou sobre o “primeiro motor imóvel”, como se isso fosse possível. Ídolos do Teatro: equívocos decorrentes das próprias ideias filosóficas, dos sistemas que não passariam de peças teatrais na crítica de Bacon. Sem a elegância e a verossimilhança das histórias inventadas para o teatro. Quase meio milênio passado e percebo, com o mais profundo desencanto, que os homens continuam a cometer os erros estudados por Bacon. E muitos outros.

domingo, 19 de abril de 2009

QUAL O TEMA?

Neste domingo, penso um tema para a próxima coluna do Expresso Ilustrado. O texto precisa ficar pronto até quarta-feira, quando levo à redação. Estou indeciso se comento sobre as mudanças na Fórmula-1, se aprecio o livro Folhas de Outono, do Cácio Machado (a ser lançado na próxima sexta-feira), ou se pego pesado contra... Acho melhor ficar com a poesia do Cácio. Na semana passada, fui excessivamente crítico.

COMENTÁRIOS ESPARSOS

A chuva deste domingo vem tarde, a quebra na safra da soja é um fato (indesejável em tempo de crise).
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Há três décadas, acompanho a Fórmula-1. Este ano, a impressão é que inverteram a ordem das grandes equipes. As últimas despontam como primeiras: Brawn GP; Red Bull... O que está acontecendo com a Ferrari, a McLaren, Williams...? Com relação aos grandes pilotos, não há necessidade de perguntar depois de Schumacher.
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Hoje é o Dia do índio. Sou contrário a essas homenagens que, ensejando uma coisa, acabam revelando subliminarmente outra (que pode ser interpretada como a continuação da avareza, do preconceito e da discriminação do branco, dominador, usurpador).
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O Exército Brasileiro, também homenageado em 19 de abril, merece a data, uma vez que consiste numa instituição com origem histórica. A propósito, os índios contribuíram para a formação do EB, cujas primórdios remontam à Batalha dos Guararapes (pintada magnificamente por Victor Meirelles de Lima).
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Ainda rascunho um poema sobre uma jovem que me chamou a atenção na sala de espera da Caixa Econômica. Ela conseguiu transformar seu rosto bonito num expositor de piercings. Trazia-os enfiado na bochecha, orelhas, nariz e sobrancelhas. Esses que ponteiam as sobrancelhas são de extremo mau gosto. Para provar sua individualidade, usa-os com uma certa empáfia. Duvido que ela os conservará aos 30, aos 40.
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Gremista, sou obrigado a ver o Internacional mais uma vez campeão gaúcho.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

METAPOEMA / METAPOESIA

Metapoema é o poema em que o autor atua como crítico para analisar o processo criativo do próprio poema, formal ou conteudisticamente. A começar pelo título metapoético, meu livro Ponteiros de palavra é composto por alguns metapoemas, entre os quais destaco
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ofício
.
abra cada
palavra
com a vara
da imagin
................ação
.
abrace
sua mais
cara
............acepção
.
cada palavra
tem uma mágica
rara
.
abra
.........cada
....................bra
.
e
..
seara
.
a palavra
(semente)
no papel
(lavra)
plantada
.
o verso
(rebento)
aflora
com gotas
de madrugada
.
o poema
(florifruto)
amadurece
no canteiro
das imagens
.
pronto
para ser
......lhi
co.........do
......mi
.
O primeiro foi transcrito no muro da escola Cândido Genro, rua Pinheiro Machado, e foi capa de uma apostila de língua portuguesa do curso de Letras em 2007. O segundo tem duas particularidades: um dos melhores versos que produzi, gotas de madrugada, e o espaço em branco, imitando um fruto, dentro dos particípios colhido / comido (amalgamados para esse objetivo).

POESIA NOS MUROS

Novos muros da nossa cidade se transformam em suporte para outro projeto do curso de Letras da URI, como é o caso deste da rua Osvaldo Aranha (quase em frente à Cooperativa Tritícola). Nele foi transcrito um poema, um insight, uma epifania de ERILAINE PEREZ, estrela que desponta brilhante nos céus da Terra dos Poetas. Mais que poesia, eis um belo exemplo de metapoesia.



A inteligência e beleza da poesia de Erilaine encontram-se no poder de síntese, difícil de ser encontrado nos iniciantes (geralmente diacrônicos, como se escrevessem em prosa). O "risco" com que começa o poema é pleno de significação. Todas as palavras demais, conquanto de menos. Segundo os modernos linguistas, esse fenômeno caracteriza a polissemia. A poeta consegue romper com a oralidade.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

ECOLOGIA OU DISCURSO INGÊNUO

Poucos discursos são tão ingênuos – para não dizer contraditórios – quanto o que formulamos ou que ouvimos acerca de uma consciência ecológica, de proteção ao meio ambiente. Ingênuos, mas justificáveis, em razão da fase inicial por que passa a nova ciência. O protocolo de Kioto, por exemplo, ao propor uma redução de 5% (cinco por cento) na emissão de dióxido de carbono (CO2), foi de uma ingenuidade risível. Em Santiago, nestes últimos anos, houve um acréscimo expressivo no número de automóveis. Nos grandes centros, o acréscimo foi incomensuravelmente maior. Em países que experimentam uma fase de rápido desenvolvimento, como a Índia e a China, o acréscimo de automóveis e de indústrias elevou à estratosfera a quantidade de gases poluidores. No princípio, a cultura agrícola era necessária para a sobrevivência do homem rural, mas passou a representar uma fonte de riqueza nos últimos séculos. A exploração e o enriquecimento material – em qualquer lugar e tempo – sempre causaram um mal a terra, à água e ao ar. Não bastasse os fatores naturais desfavoráveis à vida, a humanidade vem contribuindo de forma suicida para o desequilíbrio ambiental. O solo é abandonado à esterilidade; os rios morrem a olhos vistos (atingidos pelo câncer que se instalou em seus cursos: as cidades); e a atmosfera é transformada numa grande lixeira. O que fazemos para frear isso? Apenas discursos. No campo, o processo devastador continua mais acelerado do que antes. Na cidade, o modus vivendi contradiz o discursado. Muita água continua sendo desperdiçada ou devolvida ao ambiente suja, sem tratamento algum. Mais e mais energia é consumida, mais e mais se anda de automóvel (inclusive os que vivem a discursar sobre a necessidade de uma consciência ecológica).
Como alguém pode discursar sobre Ecologia com uma vasta piscina em casa, um ou dois automóveis e sem a leitura de um James Lovelock (mestre do nosso saudoso José Lutzenberger)?

quarta-feira, 15 de abril de 2009

CATARSE OU REMISSÃO


Hoje minha mãe fazia aniversário. Um dia inesquecível desde que passei a me entender por gente. Desenvolvi a capacidade de memorizar essas datas especiais para as pessoas do meu universo social. Mais tarde, passei a anotá-las na agenda. Dia 15 de abril era o aniversário da mãe, quando deveria se sentir mais feliz. Não demonstrava isso, no entanto. Eu aprendi com ela a conter certas manifestações afetivas, em palavras e gestos. Isso era costume nas famílias do interior, cuja poderosa influência ainda não se observa como exceção nestes dias. A mãe aniversariava, e ninguém dizia qualquer coisa. Eu e minhas irmãs ficávamos mais felizes, mas comíamos o pudim em silêncio. Com a maturidade, perdi um pouco aquela vergonha discursiva e gestual, não o suficiente para ter sido um filho mais doce, mais amoroso. D. Dalva faleceu há três anos, exatamente no dia em que fazia aniversário, 15 de abril. Nenhum acontecimento foi e continua sendo mais doloroso para mim. Tudo o que escrevo sobre minha mãe (após sua morte) é, de certa maneira, catarse ou remissão.

terça-feira, 14 de abril de 2009

RINCÃO DOS MACHADO

Nesse fim de semana, fui ao Rincão dos Machado. Não há outro lugar em que me sinto melhor. Lá é minha infância, meu Ixtlán. Muita paz (estado de espírito impossível de se alcançar na cidade, ainda que em Santiago). Muito vinho crioulo, que meus parentes insistem em tomar morno. Muito peixe frito e assado (da carpa ao salmão). Gente da gente. Até chimarrão tomei com meu pai de manhã cedo. Aprendi o "cinquilo", "cincoil", jogo de cartas com cinco participantes. O jogador de mão determina o trunfo, baseado em suas cartas, e chama um três para companheiro. Quando um dos participantes se achar seguro de jogar sozinho, propõe o "sólo".

O PINTOR QUE ESCREVIA


Hoje concluí a leitura do romance O pintor que escrevia - amor e pecado, de Leticia Wierzchowski (que ficou conhecida nacionalmente como a autora de A casa das sete mulheres, televisionada pela Rede Globo). No começo, minha intenção era de ler como um crítico, que vislumbra a perspectiva de lançar-se na prosa romanesca, e concluí como um leitor apaixonado, envolvido pela história. Esta é narrada em dois capítulos temporais: setembro de 1958 (11 páginas) e abril de 1978 (121 páginas). (William Faulkner, um dos maiores romancistas de todas as literaturas, empregou esses saltos no tempo, com retorno inclusive, em O som e a fúria.) Espaço aberto e fechado: a Serra Gaúcha. Personagens: Antônia Maestro; Amapola, filha de Antônia; Marco Belucci, pintor, amante e irmão de Amapola; Augusto Seara, marchand de São Paulo; Zeca, empregado de Augusto; Ana e Mateus, caseiros da casa de Antônia. Antônia vem da Itália com a filha e Marco Belucci, um judeu que foge da Grande Guerra nos braços de Amapola, a qual não sabe que é sua irmã. Antônia, que morre louca, armou essa relação para ter um neto perfeito. Os italianos se estabelecem num sítio da Serra Gaúcha. Um belo dia, Marco se suicida, lançando-se do sótão em que pintava. Vinte anos depois, Amapola contata com Augusto, marchand que venderá as telas de Marco Belucci. Augusto e Zeca vêm ao sítio e descobrem que, atrás de cada quadro, há um texto escrito pelo artista, que relata seu grande amor por Amapola. Augusto delira com essa descoberta, mas promete junto ao túmulo de Marco que guardará o segredo.
A única frase que destaquei do romance: "o mundo nem sempre tem a doçura necessária ao amor" (página 118).

desluarizada


a lua amanheceu
no céu
da manhã
sem a pintura
da noite
quando fora
amante
a face fixada
no vasto caminho
de volta
triste
desluarizada
no céu
nada seu

COMENTÁRIO RECEBIDO

Olá, Froilam.
Tudo bem? Sou a Cecília e trabalho na Edelman, agência de comunicação de Jorge Zahar Editor. Recentemente fizemos uma promoção no site onde os internautas podiam enviar perguntas ao autor e as melhores frases seriam respondidas por ele. Você chegou a ver? Foi bem bacana. Os assuntos abordados por Bauman são sempre uma discussão saudável!
Abraços

domingo, 12 de abril de 2009

FOGO TEMPORÁRIO


O título acima identifica a coluna de L.F.Veríssimo para o caderno Donna (ZH) deste domingo. Um texto desmistificador (ou desmitificador), razão pela qual o transcrevo neste espaço.
"O francês Jacques Le Goff era (ou ainda é, acho que está vivo) um historiador especializado na Idade Média. É dele a teoria de que o Purgatório foi criado oficialmente pela Igreja, na segunda metade do século 12, para permitir que bons católicos pudessem emprestar dinheiro a juros sem ir direto para o Inferno, que até então era o castigo prescrito para a usura. O edito pontifical que determinou essa radical mudança na geografia do Além chamava o Purgatorium, palavra que usava pela primeira vez como substantivo em vez de adjetivo, de "fogo temporário". O martírio do Purgatório era igual ao do Inferno, mas com prazo para terminar. Depois de purgada, a alma do cristão ia para o Céu, ficha limpa. E os lucros com os juros em vida mais que compensavam o sofrimento temporário depois da morte."

Sem comentários.

sábado, 11 de abril de 2009

ZYGMUNT BAUMAN


O caderno Cultura (ZH) deste sábado traz as ideias do sociólogo Zygmunt Bauman. A entrevista se resume em tópicos, sem a edição dos elementos fáticos. Bauman fala sobre a infelicidade, o nirvana, o desejo, o consumismo, a crise, as drogas, a ganância, a estratégia (da sociologia), entre outros assuntos. Para o pensador,
"a felicidade pode ser apenas uma experiência momentânea".
Depois de citar Freud, conclui:
"Nós sabemos como a infelicidade é, podemos nomeá-la e descrevê-la de forma muito detalhada. Mas nós só podemos visualizar a felicidade como superação/eliminação da infelicidade - e o erro comum, embora enganoso e oneroso, é prever que, se apenas este espinho for puxado para fora do nosso corpo, a vida será feliz".
O polonês radicado na Inglaterra fala que os budistas, para resolver esse problema existencial, chegaram ao nirvana:
"um estado de perfeito serenidade atingido pela erradicação de todos os desejos".
Seria um grande erro desejar e lutar para satisfazer o desejo, um erro que é a causa da nossa infelicidade.
"A nossa modernidade tomou o caminho inverso de manter o desejo não somente vivo, mas de expandi-lo e torná-lo mais intenso [...]. Um dos documentos fundadores da era moderna, a Declaração Americana da Independência, proclamou a 'perseguição da felicidade' como um direito humano universal e inalienável. [...] Na vida moderna, incitada e impulsionada por desejos, a busca da felicidade tem sido identificada com o crescimento do consumo. O resultado é o consumismo: algo mais do que apenas 'consumo', que tem sido a condição natural não apenas dos humanos, mas de toda e qualquer vida. 'Consumismo' significa o desenvolvimento de outra ideia e uma preocupação humana bastante comum com o consumo elevado à categoria de filosofia total de vida, e uma estratégia de vida abrangente, ambas moldando o mundo como um contêiner lotado de possíveis bons consumidores [...]. A necessidade normal de consumo, comum a todos os organismos vivos, se transformou no motor da sociedade moderna: agora, a sobrevivência e a perpetuação da sociedade moderna tornaram-se dependentes do aumento contínuo dos desejos de consumo e da intensidade de compras. É por isso que o atual colapso dos bancos de crédito representa um verdadeiro desastre. Ele atinge o cerne do consumidor, da sociedade consumidores e da cultura consumista. A crise atual não é apenas a questão (temporária?) queda do consumo, mas da própria sustentabilidade do consumismo."
[...]
"Ouvimos falar dos Estados Unidos que US$ 70 bilhões, cerca de 10% dos subsídios que as autoridades federais americanas pretendem injetar no sistema bancário do país, já foram usados para o pagamento de bônus às pessoas que trouxeram esse sistema para perto da ruína... No entanto, são impressionantes as medidas já tomadas pelos governantes, pensadas por eles ou declaradas, que estão todas apontadas para a recapitalização dos bancos e a capacitação deles para retornar ao 'negócio normal': em outras palavras, à atividade que produziu a responsabilidade principal da atual crise."
[...]
A fala de Bauman continua (transcrita ao longo de duas páginas).
Obras: Medo líquido (Zahar, 240 páginas, R$ 30,00); A arte da vida (Zahar, 184 páginas, R$ 29,90). Mais: O mal-estar da humanidade; Em busca da política; Ética pós-moderna; Amor líquido; Vidas desperdiçadas; A sociedade individualizada; Europa: uma aventura inacabada...

quinta-feira, 9 de abril de 2009

O INAUDITO

(COLUNA DO EXPRESSO ILUSTRADO DE 10 ABR 2009)
A característica desta coluna é fugir do lugar-comum, do já dito, do que todo mundo sabe, do que não provoca uma reflexão. Dessa forma, o que escrever sobre o dia de hoje, Sexta-feira Santa, sem incorrer numa repetição, numa tautologia, encher linguiça, chover no molhado? Meu texto é uma extensão da minha personalidade: prefiro o silêncio a papagaiar, falar pelos cotovelos, sem o principal argumento de autoridade oferecido pela razão. A melhor alternativa para uma data destas é um texto narrativo, uma crônica, por exemplo, rememorando minha “idade-média”, quando levantava cedo, fazia jejum, colhia marcela, comia peixe e nada prestava fazer antes que deitasse na expectativa do Sábado de Aleluia. Se bem me lembro, nas edições dos anos anteriores, fui tipologicamente narrativo. Ao mesmo tempo, agradei aos leitores saudosistas e evitei o desenvolvimento de uma ideia, de uma argumentação contra a tradição católica de juntar dois dias tão opostos, como a Sexta-feira Santa e Sábado de Aleluia. Hoje, luto extremo; amanhã, alegre desforra. Hoje, jejum; amanhã, comilança. Hoje, marcela; amanhã, (bar)ceva. Hoje, via crucis; amanhã, vingança. Hoje, reza; amanhã, dança. Hoje, morte; (depois de) amanhã, ressurreição. Hoje, Cristo; (depois de) amanhã, coelho. Enfim, uma série de oposições apenas possíveis dentro de um sistema tão contraditório quanto o é o próprio homem. Mas não é desta vez que hei de dissertar sobre tais coisas desmistificadoras, respeitando aqueles que seguem o rito católico. Limitar-me-ei a dizer o seguinte: não posso acompanhá-los, depois de ter pensado com Copérnico, Darwin, Nietzsche, Freud, Russel, entre outros. Um ótimo fim de semana a todos.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

DIFÍCIL DE "ENGOLIR"

No último número de Seleções, revista que cai em qualidade a cada edição nas últimas décadas, foi publicada uma entrevista com Augusto Cury. Abaixo transcreverei algumas das perguntas feitas a Cury pela condutora da entrevista, com suas respostas. A prova é necessária para meus comentários a seguir.
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P. Por que o senhor não gosta de dar entrevista? (Paulo Coelho também não gostava no início)
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R. O culto à celebridade é o sintoma de uma sociedade doente. Raramente dou entrevistas, embora alguns órgãos da imprensa me considerem o autor brasileiro mais lido no país atualmente. Não sou melhor do que ninguém. [...] Prefiro o anonimato.
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Comentário: No mínimo, três abobrinhas juntas. (Houaiss traz uma excelente definição para o termo abobrinha). A afirmação de que "o culto à celebridade é o sintoma de uma sociedade doente" não é verdadeira. Qual a relação disso com o que diz em seguida, de que "raramente dou entrevista"? Diga-se de passagem, um fato que dificilmente pode ser comprovado pelo leitor. Para ser coerente, Cury não deve dar importância à sua celebridade, correto? Todavia, tem na ponta da língua o dado de que órgãos da imprensa o consideram "o autor brasileiro mais lido atualmente". Ao responder que não se acha melhor do que ninguém, incorre em falsa modéstia, ou ele não vê diferença qualitativa entre si e a "sociedade doente"? A maior das abobrinhas é dizer que prefere o anonimato. Ao dar uma entrevista para Seleções, ele não abre mão dessa preferência? Obviamente. Para manter-se no anonimato, o autor deveria ter um pseudônimo.
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P. Qual será o próximo lançamento?
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R. Meu próximo livro, que sai em maio, é a continuação de O vendedor de sonhos e vai se chamar A revolução dos anônimos. Nele, evidencio que os anônimos têm, no teatro social, uma grandeza tão ou mais admirável que os políticos ou os atores de Hollywood.
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Cury acredita no que diz? Os anônimos seriam mais admiráveis que os políticos ou os atores de Hollywood? Uma ova! Políticos e atores famosos deixam de pertencer ao "teatro social"? Talvez esteja nessas contradições e hipocrisias o segredo para vender tantos livros. Os leitores anônimos, que o leem sem criticidade alguma, pertencem à sociedade doente ou não?

OBJETO

a palavra é som
articulado
ensina o gramático
.
a palavra é signo
emenda
o linguista
.
a palavra é objeto
inventa
o poeta

(com a palavra-objeto
muitas coisas
podem ser feitas,
inclusive um poema)

terça-feira, 7 de abril de 2009

AS PALAVRAS


as palavras
são poucas
e são tantas
as palavras
são santas
e são outras
as palavras
são simples
e são mantras
as palavras
são certas
e são loucas
as palavras
são tintas
e são brancas
as palavras
são presas
e são soltas
as palavras
são poucas
e são tantas
as palavras

segunda-feira, 6 de abril de 2009

ATÉ QUE ENFIM!

Desde que passei a ler Nietzsche e Darwin (por intermédio dos neo-darwinistas) na décana de oitenta, ansiava para que as pessoas soubessem as ideias de um e de outro. Vinte e muitos anos depois, vejo com um certo gostinho de vitória que jornais, revistas, livros, televisão, Internet, toda a grande mídia, enfim, têm difundido o nietzschismo e o darwinismo incessantemente. O último número da Nova Escola traz como principal matéria, manchetada na capa, "A origem da vida".
Abaixo, lê-se: Com a Teoria da Evolução, o inglês Charles Darwin explicou que todos os seres vivos surgiram de um organismo semelhante a uma bactéria. Entenda como ele chegou a essa conclusão e a importância disso para a sala de aula.
No interior da revista:
A ideia que revolucionou o sentido da vida
Ao afirmar que todos os seres vivos descendem de um mesmo ancestral comum e que a vida na Terra surgiu há milhões (na verdade, há bilhões) de anos, Charles Darwin lançou as bases da Biologia moderna e mudou nossa forma de ver o mundo.

Interessante essa Árvore da Vida, ilustrando a ancestralidade comum a todos os seres vivos. Uma pena que aqui a edição cortou o grande caule e as primeiras ramificações (reinos monera, protista, fungi, plantae e animalia).

"BOI DE PIRANHA"


Todo torcedor gremista diz que a demissão de Celso Roth é muito boa para o Grêmio, ou porque não sabia escalar o time, ou porque teimava em ser defensivo, ou porque perdeu os últimos grenais (o que é insuportável), ou porque isto, ou porque aquilo. Mas ninguém disse que essa saída será benéfica para o Grêmio, porque, a partir de agora, comprovar-se-á que o pior futebol jogado há 40 anos no Olímpico não é culpa exclusiva do treinador, mas dos demais componentes da equipe, dos jogadores aos diretores (não necessariamente nessa ordem). O problema do Grêmio é estrutural. Ninguém sentirá saudade do Roth, obviamente, no entanto, antes de acabar o presente ano, ele será absolvido como "boi de piranha". Infelizmente, o torcedor ainda não percebeu isso e o culpa pelo péssimo desempenho no Campeonato Gaúcho. Logo passará a culpar a fraca diretoria do clube, razão pela qual foi tardia a demissão do treinador.

domingo, 5 de abril de 2009

TESE SIMPLES

Por favor, não me tomem por pedante, mas preciso tornar público que já tenho uma ideia sobre a popularidade do verso de sete sílabas. Antes de expressá-la, repito que a chamada "poesia crioula" e as letras musicadas no Rio Grande do Sul, de Teixeirinha aos Festivais Nativistas, são preponderantemente heptassilábicas. As trovas e payadas também. Minha tese é a seguinte: nenhum outro comprimento de verso coincide com a estrutura frasal simples, da fala: sujeito + predicado. Exemplos: o trevo tem quatro folhas; eu sinto muita saudade; meu pingo mascava o freio; eu mandei fazer um laço...

O RITMO

O ritmo de um poema não é só conseguido pela métrica, observando certa regularidade na disposição de sílabas fortes (tônicas) em cada verso, mas também é resultante de "efeitos sonoros ou jogos de repetições", segundo Norma Goldstein. A repetição de sílabas fortes, de fonemas, de palavras ou até mesmo de versos constitui a base do ritmo. Se os clássicos se fundamentavam no metro para ritmar, os modernos preferem o ritmo de unidades maiores. O ritmo metrificado era necessário para sustentar a forma verbal independente da música (em que a poesia tivera origem). O ritmo livre é necessário para distinguir a poesia da prosa.
Fernando Pessoa escreve: "A arte que se faz com a ideia, e portanto com a palavra, tem duas formas - a poesia e a prosa. Visto que ambas se formam de palavras, não há entre elas diferença substancial. A diferença que há é acidental, e, sendo acidental, tem que derivar-se daquilo que é acidental, ou exterior, na palavra. O que há de exterior na palavra é o som: o que há, pois, de exterior numa série de palavras é o ritmo". (Transcrito do livro A Poesia - Uma Iniciação à Leitura Poética, de Armindo Trevisan.)

sábado, 4 de abril de 2009

VERSOS HEPTASSÍLABOS II

Poemas escritos em versos heptassílabos (redondilha maior), ou com preponderância heptassilábica:
- Martín Fierro, de José Hernández;
- Morte e vida severina, de João Cabral de Melo Neto;
- Antônio Chimango, de Amaro Juvenal (pseudônimo de Ramiro Barcellos);
- Romances de Estância e Querência, de Aureliano F. Pinto;
- Cancioneiro de Trovas, de Hugo Ramírez;
- Quadrinhas, de autores diversos;
- ...
A Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, não fosse em versos heptassílabos, certamente não seria um dos poemas mais recitados da Literatura Brasileira.

VERSOS HEPTASSÍLABOS (7 SÍLABAS)

Os poetas iniciantes na arte se dizem visceralmente desobedientes à metrificação, desenvolvendo uma ojeriza pelo processo. Dessa forma, passam a produzir versos livres e nem sempre brancos, uma vez que continuam a rimar no final da linha. A rima conduz à estrofação regular (que sempre foi uma característica de poemas compostos com versos isométricos). O resultado final é de um ineditismo formal jamais visto na história da Literatura, desde os trovadores medievais aos poetas contemporâneos. Se tomarmos a poesia brasileira depois da revolução modernista, independente dos cânones consagrados pelas escolas parnasiana e simbolista, veremos que os grandes poetas não deixaram de produzir metricamente. Quase a totalidade da obra nejariana foi produzida em sete ou dez sílabas poéticas. Quase a totalidade da poesia crioula, cujo melhor exemplo é Jayme Caetano Braun, continua em heptassílabos (para espanto dos nossos compositores-poetas):
A um - bo-chin-cho, - cer-ta - fei-ta,
fui - che-gan-do - de - cu-rio-so.
Que o - ví-cio é - que - nem - sar-no-so,
nun-ca - pa-ra, - nem - se a-jei-ta.
Bai-le - de - gen-te - di-rei-ta,
vi - de - pron-to - que - não - e-ra.
Na - noi-te - de - pri-ma-ve-ra,
ga-gue-ja-va a - voz - dum - tan-go,
e eu - sou - lou-co - por -fan-dan-go
que - nem - pin-to - por - qui-re-ra.
....
Salvo raríssimas exceções, não encontramos casos de versos livres rimados entre si. Ao contrário, um dos melhores poemas gauchescos é Paisano, escrito por Luiz Menezes, obedece à métrica e apenas ocasionalmente à rima (nos dois primeiros versos):
Um - di-a - che-gou - de - lon-ge,
nun-ca - se - sou-be - de - don-de...
Cha-péu - que-bra-do - na - tes-ta
e um - len-ço - pre-to ao - pes-co-ço,
ne-gro - co-mo o - pen-sa-men-to
de u-ma - chi-na - des-pei-ta-da.
...
O melhor exemplo de versos livres na poesia gauchesca é Herança, de Apparício Silva Rillo:
...
Naqueles tempos, sim,
naqueles tempos os bois mandavam nos homens,
e por isso a vida era mansa na cidadezinha arrodeada de ventos,
chácaras e estâncias.
Os touros cumpriam devotamente o seu mister
e as vacas, pacientes, pariam terneiros e terneiros e terneiros.
O campo engordava os bois,
as tropas de abril engordavam os homens
e os homens engordavam as mulheres.
...
Arrisco afirmar que o melhor da poesia, que nasceu do ritmo, irmã da música, sempre terá forma definida com uma regularidade apolínea. Nenhum poema superará o soneto. O que recitamos de Camões, Olavo Bilac, Vinícius de Moraes...?

sexta-feira, 3 de abril de 2009

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Em minha coluna desta edição do Expresso Ilustrado, escrevo sobre a deseducação, fenômeno social que se oberva em constante crescimento. A abordagem um tanto pessimista não reflete a realidade de Santiago, onde o processo educativo ainda é dominante, em razão de vários fatores, como a competência de nossos professores. Sugiro aos leitores de Crítica e Autocrítica que considerem meu texto desta sexta-feira (editado abaixo) o libelo de uma situação apenas antevista nas grandes cidades deste país. Os professores santiaguenses sequer vivem a condição de heroicidade trágica. Aqui a ordem ainda dita as regras, responsável pelo notado feedback positivo.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

PENDURADO NA ENTRADA DA CASA

Bem-vindo
.......................irmão
para entrares
em nossa casa
e comer
.................de nosso pão
.
Mas antes
..................Te peço
.
PRIMEIRO:
.....................Retira
.......a borra e a ira
de teu pensamento
.
te desembrulha
desse avaro pano
............................imundo
.
SEGUNDO:
........................Veste
o Sagrado linho alvo
....com que vieste
ao mundo
.
Lava as mãos e o rosto
.
ISTO POSTO:
Te assenta tranquilo
com paz
................... e leveza
para partilhar
......................de nossa mesa.
.
(O poema acima é de Cácio Machado, poeta santiaguense que lançará Folhas de Outono ainda este mês.)