sábado, 22 de novembro de 2008

AURELIANO SONETISTA

Aureliano de Figueiredo Pinto é um dos homenageados na próxima quadra da Rua dos Poetas. Todos o conhecem como o autor de Romances de estância e querência, livro de poesia crioula, como esta estrofe de Chimarrão da madrugada:
oo
É um gosto olhar os brasidos
e os luxos das lavaredas
dançando rendas e sedas
para a ilusão dos sentidos.
E entre o amargo e a tragada
tranqueiam na madrugada
tantos recuerdos perdidos.
oo
Mas Aureliano escreveu sonetos (de amor), reunidos num livro publicado postumamente: Itinerário - Poemas de cada instante. Transcrevo o último parágrafo da apresentação feita por Carlos Jorge Appel:

Em Itinerário, o dia-a-dia da campanha cede lugar ao mundo interior, onde os temas são a transitoriedade do amor, a paixão, a perda da mulher amada, a desolação, a morte, os limites do ser humano. A linguagem acompanha a universalização dos temas e alcança uma dimensão clássica, ou seja, aquela dimensão que está para além de todos os modismos e circunstâncias e que expressam o essencial do homem de todos os tempos.

Eis um exemplo dessa outra face poética de Aureliano:

XIV
oo
Este encantado amor com que te quero
toma os aspectos de um estranho culto.
Sofro e me exalto! E, no martírio, exulto
na própria mágoa em que me desespero.

Cruzam-me, às vezes, no semblante austero,
revoadas de alegrias em tumulto.
Outras, amargo, ao suspeitar teu vulto
queimaria cidades como Nero...

Dualidade, de todos os minutos!
Dás-me a virtude da mais pura estima
e o instinto em raiva de cem faunos brutos.
oo
Nestas oscilações, hora por hora,
és toda a luz do céu que me sublima
e a fogueira infernal que me devora.

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