sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

IDÉIAS VERSUS SENTIMENTOS

Depreendo que a quase totalidade dos comentários neste blog se refere a postagens pessoais, que dizem respeito ao sentir, ao coração. Apenas um por cento comenta acerca das idéias, como o faz minha amiga Adriana Parise em Reflexões.
Com base nessa preferência, devo reconhecer que tenho recebido um número de visitantes acima do merecido. Já é tempo de mudar a cara, o título e o tema predominante de minhas postagens.
Sempre considerei as idéias fundamentais para a vida, como se fossem luz expandindo dentro de um universo escuro. Por isso, minha admiração por filósofos e cientistas.
Quanto aos sentimentos, o máximo que fiz foi transfigurá-los em substrato poético, filtrando sua densidade através das palavras. Na hora de falar deles abertamente, sou qual um menino ingênuo, digno de pena (ou de riso).A partir de hoje, todavia, caso queira me apresentar como discípulo da doçura, preciso atender à maioria dos meus leitores.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

CINZA SOBRE O VERDE

o verde tomou conta feito hera nas paredes do sonho de repente por uma fresta da tarde entrou o semeador de cinza e a casa ficou triste com o seu coração vazio

AMORES


ooooooooooamores vêm
ooooooooooooamores vão
oooooooooocomo ondas
oooooooooooooood'água
ooooooooootrazem flores
ooooooooooquando vêm
oooooooooovão sargaços
ooooooooooquando mágoa
ooo
ooooooooooamores vêm
ooooooooooamores voam
oooooooooocomo pássaros
oooooooooode arribação
ooooooooooooooooo
oooooooooooooooooomesmo
ooooooooooque passem
ooooooooooos amores
ooooooooooooooooooooonão vêm
oooooooooooooooooooooem vão

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

REFLEXÕES

O EQUÍVOCO DE ROUSSEAU - Dizer que o homem não é um ser violento, por sua natureza, mas que a sociedade o torna violento constitui a mais cômoda idealização anti-cientientífica dos últimos séculos (marcados pela cientificidade). Cômoda porque preserva o mito judaico-cristão de que o homem descende de um deus infinitamente bom.
A sociedade perverte, porque seus integrantes, nada mais do que homens, são maus desde a origem.
ooo
O SÁBIO ALEMÃO - Engana-se quem acha que o título ao lado se refere a Nietzsche. Desta vez, trata-se do maior poeta da língua alemã (citado pelo filósofo em sua Da Utilidade e do Inconveniente da História para a Vida): GOETHE. De acordo com o grande sábio, o homem, ao mesmo tempo em que cultiva suas virtudes, cultiva seus vícios.
Essa verdade precisa ser compreendida por aqueles que ainda acreditam no homem como um ser exclusivamente bom, isto é, por todos os humanos, à exceção dos sábios.
ooo
INTOLERÂNCIA RELIGIOSA - O homem que crê em um deus representa um gene que compõe o grande organismo da sociedade religiosa. A intolerância é uma de suas principais características, cuja essência é atribuir todo tipo de maldades aos ateus, como se estes fossem responsáveis por classificar a vida como um ato pecador e a Terra, como um "vale de lágrimas".
O rótulo de uma religião é facilmente colado na testa dos fracos (pelo medo) e dos espertos (pela hipocrisia).

domingo, 24 de fevereiro de 2008

PELO CELULAR

na tua boca
(ontem)
chegava a aurora
e no teu peito
repousavam do dia
os pássaros
(agora)
minhas mãos
são asas sem ninho
e os pássaros
não cantam
na janela da noite
quando a poesia
se apaga
na ausência
de teus olhos

oooooooooode avelã
quando de mim
resta o que ontem
fui amanhã

sábado, 23 de fevereiro de 2008

O SÁBADO SERIA AZUL?

Se não estou enganado (digo isso mesmo que raramente me engane), foi Ramalho Ortigão quem atribuiu cores aos dias da semana. Para o escritor português, o sábado seria azul (o domingo, dourado...). Quando morava em Curitiba, entre os anos de 1985 e 1993, lembro-me de uns sábados azuis. Aqui, em Santiago, foram raros. Tudo porque desamando ou amando, magôo sem querer a(s) pessoa(s) (des)amada(s). Caso deste sábado, de um azul claríssimo que chega a doer nos olhos, objetivamente falando. Tem outra cor o meu sábado, tem outro brilho os meus olhos.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

rúbida rosa

um jeito de jardineiro, preciso, delicado,
a rosa exige ao ser apanhada de sua haste
sem que se lhe marque a macia tessitura das pétalas,
sem que se lhe altere
a forma e o conteúdo
oo
também os espinhos exigem cuidado
de hábeis dedos de jardineiro
que não manche de sangue
a rosa rúbida

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

CONFISSÃO

000000000n(sem palavras)

UM PÁSSARO CHAMADO AMOR

Agora, que faço eu da vida sem você?
Você não me ensinou a te esquecer
Você só me ensinou a te querer
e te querendo eu vou tentando me encontrar...
ooo
Uma das composições de Caetano Veloso canta o vazio que sentimos a partir do dia em que nos separamos da pessoa amada, relendo poemas que nos faz encher os olhos.
ooo
o pássaro que ontem cantava
já não canta...
morreu de uma flor na boca
não do espinho na garganta

domingo, 17 de fevereiro de 2008

A LUA CHEIA DETERMINA A PÁSCOA

Alguém me perguntou o que (ou quem) determinava a data de realização do Carnaval. Por que a enorme variação de um ano para outro? Na hora, sem pestanejar, disse-lhe que o referencial só poderia ser a Páscoa, sob a gestão da Igreja Católica. Assim, a dúvida é saber por que a ressurreição de Cristo muda tanto de um ano para outro. Hoje, lendo o Diário de Santa Maria, obtive a resposta. Um padre responde: A Páscoa cai no primeiro domingo depois da primeira lua cheia da primavera no hemisfério norte. A partir desse fenômeno natural, passível de ser fixado no calendário com bastante antecedência, basta recuar 40 dias para se saber o período de quaresma e da grande festa que o precede. No ano que vem, por exemplo, o primeiro domingo depois da primeira lua cheia da primavera no hemisfério norte cairá no dia 12 de abril. A terça de carnaval, portanto, será no dia 3 de março (quase um mês de diferença em relação a este ano). Jamais imaginaria que a Lua, ou melhor, uma visão parcial dela de determinado pontoda Terra, pudesse constituir o referencial de um dia tão especial para os cristãos, representativo da maior espiritualidade. Justamente a Lua, que sempre esteve ligada aos rituais pagãos.
OOO
(Esboço para a coluna do Expresso Ilustrado)

sábado, 16 de fevereiro de 2008

felicidade

hoje se perde
quando
chega amanhã

felicidade
não há
que não passe
nos vãos

de hoje
e que se perca

quando
amanhã chega
com novos
vooãooooos

OOO
(poema de Erilaine Perez)

dentro dos olhos




oooooooooodentro dos teus olhos

oooooooooooscilam instantes

oooooooooode verdes intensos

ooooooooooe cinza de estrelas

ooooooooooque morrem distantes

ooo

oooooooooodentro dos teus olhos

oooooooooomeus olhos errantes
OOO
(O POEMA ACIMA IMITA AS CANTIGAS DE AMIGO, DO TROVADORISMO MEDIEVAL, CUJO EU-LÍRICO É FEMININO)

A MELHOR POESIA









OOOOOOOOOOOOOOOODepois de um curso de pós-graduação muito puxado, que me exigiu leitura específica, retorno à melhor poesia: Pablo Neruda, João Cabral de Melo Neto e Manoel de Barros. Em Confieso que he vivido, Neruda continua poético na prosa, principalmente ao narrar encontros e descrever seus amigos poetas (García Lorca, César Vallejo, Miguel Hernández, Rafael Alberti, entre outros).
Já recitei excertos de Morte e vida severina, mas nunca me debruçara sobre os demais poemas de João Cabral, certamente um dos três maiores nomes da poesia no Brasil.
Semana passada, chegou-me às mãos os livros Gramática expositiva do chão, Memórias inventadas e Livros das ignorãças, de Manoel de Barros. O poeta mato-grossense já foi definido como o “Guimarães Rosa da poesia”, “o grande poeta das pequenas coisas”, “o poeta do Pantanal”, “o virtuoso do realismo mágico”. Alguns versos de encantamento desse alquimista da literatura contemporânea:
todos catavam pregos na beira do rio para enfiar no horizonte; as coisas que não existem são mais bonitas; no chão de minha voz tem um outono; meu fanal é um poente com andorinhas; não posso mais saber quando amanheço ontem; as coisas me ampliaram para menos; uso as palavras para compor meus silêncios...
Gosto tanto de ler Manoel de Barros que devo adquirir toda sua obra (19 livros). Hoje leio autores, independentemente de títulos.
Aos leitores mais novos da nossa terra, mormente os que já escrevem, recomendo os poetas acima.
Observação:
Neruda precisa ser lido em espanhol, uma vez que elementos essenciais da poesia se perdem com a tradução.
OOO
(Publicado na coluna do Expresso Ilustrado de 15 fev 2008)

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

PRIMEIRA DAMA

Esta é boa (a notícia, é claro):
Declaração dada pela atriz Scarlett Johansson: Estou noiva de Barack Obama.
Obama é candidato para presidente dos Estados Unidos. Scarlett fez muitos filmes, entre os quais Moça com brinco de pérola, Encontros e desencontros e Match Point. Em 2006, uma revista para homens elegeu a atriz a mulher mais sexy do mundo.
Caso Barack ganhar as eleições, os estadunidenses terão a mais bela primeira dama da história.
Eu votaria nesse democrata.


sábado, 9 de fevereiro de 2008

IMPASSE

difícil
ser eu
mas quem
de
se o outro
sub-
repticiamente
me invade
para levar
metade
de mim
e deixar
de si
metade?

poema fonético

ninguém
ooofui zé
até
ser jó
ooozé fui
alguém
pra ho
oooojé ser
a men

(IN)CONSCIENTE(MENTE)

Uma das últimas postagens do blog do Júlio Prates relaciona suicídio e depressão. Seu (hiper)texto me serviu de sugestão para o tema que discorrerei a seguir.
A depressão arrasta o indivíduo a “saltar da ponte e da vida”(*), dando origem ao mais sério problema filosófico (de acordo com Albert Camus): o suicídio. Ainda que possa ter determinante genética, a doença só se manifesta, por sua vez, como resultante de um quadro existencial que lhe é propício. Esse câncer psíquico se desenvolve com vários nomes, mas acaba sendo reconhecido tardiamente, às vezes sem conexão observável com as causas que preexistiam. Entre essas causas, cito o pessimismo crônico, o hipocondrismo, a avareza, o medo, a angústia, o narcisismo secundário, a depreciação contemplativa, o excesso de sensibilidade (como bem destaca o Júlio, em seu nietzschianismo). Quanto à falta de fé, questiono. Fé na vida? Fé num outro mundo? A criação mítica, religiosa e moral de um mundo além esvazia a importância deste mundo. A tradição judaica, cristã e islâmica (aqui, sou eu a me confessar leitor de Nietzsche) constitui a causa sub-reptícia de muitos suicídios, porque dota os ocidentais do gene da má consciência, do sentimento de culpa. Os orientais também se matam, obviamente, levados por outras formas de crenças niilistas (como os camicases e homens-bomba). A propósito, os tipos acima provocavam e provocam sua morte conscientemente, escolha que não tem o deprimido algumas vezes, visto que o instrumento com o qual se suicida inconscientemente, o remédio ou a droga, oblitera-lhe a consciência do ato contra a própria vida.
Quando falamos em suicídio, quase nunca nos referimos às suas formas inconscientes. O alcoolismo é uma delas. O consumo da bebida destilada, mais forte, por um motivo racionalizado pelo consumista, viabiliza o processo suicidógeno (que tramita sub-repticiamente). O indivíduo, sem saber, segue a filosofia de Jack, o estripador: por partes. Mata-se aos poucos: boca, laringe, estômago, fígado, rins, bexiga, cérebro... A morte do suicida só ocorre inteiramente depois de muito sofrimento, extensivo aos familiares que não o abandonam (por comiseração).
Outra forma de suicídio inconsciente consiste no uso dos demais tipos de droga, incluindo os antidepressivos (tarja preta). Uma outra mais depreende-se da má condução do veículo automotor (carro, caminhão, moto...), como deslocar-se em alta velocidade. Na direção, o pretersuicida também pode ser caraterizado como preter-assassino. Mais consciente é claro.
A sociedade, todavia, não reconhece no alcoólatra, no drogado e no motorista (mau) possíveis suicidas, merecedores de um tratamento especial. Como são muitos, o que compromete a imagem que a sociedade tem de si, de pretensa normalidade, o melhor é, no máximo, considerar os tipos acima doentes ou irresponsáveis.
A verdade é que, concordando com o sentimento do Júlio, somos impotentes para resolver qualquer problema social – por mais que pensemos, escrevamos ou ajamos altruisticamente. O reconhecimento dessa impotência poderá se constituir na causa de angústia, depressão e... suicídio.

000
(*) Verso de Morte e vida Severina, de João Cabral de Melo Neto

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

TIDE, VILSON COLPO, ÉDIPO E JOÃO CABRAL

A livraria do Tide, na Rua dos Poetas, já é um ponto de encontro dos bibliófilos de Santiago, leitores e intelectuais. Não demora, o espaço entre os livros ficará pequeno. Hoje tive um diálogo com o Vilson Colpo, agricultor de Cerca de Pedras e um dos homens que mais gosta de ler em Santiago. Dois livros me chamaram a atenção: Édipo africano, de Marie Cécile e Edmond Ortigues, e Poesias completas, de João Cabral de Melo Neto. Orelha do primeiro: "É possível a prática da psicanálise numa sociedade com fortes tradições e práticas não-européias? Como se dá o atendiment psicanalítico havendo necessidade do intérprete? Como se constitui o complexo de Édipo numa sociedade tribal?". Sempre quis dispor da obra completa de João Cabral, um dos três grandes nomes da poética no Brasil. Pena que me falta tempo ou disposição de espírito para a leitura nestes dias.

O ANO COMEÇA

Santiago acordou nesta quarta-feira como vinha acordando desde sábado: tranqüila qual uma imensa fazenda, muitos pássaros, o céu mais azul deste verão, alguns automóveis... Dias e noites transcorreram com um clima agradável. Os santiaguenses estamos satisfeitos com o melhor carnaval de todos os tempos. O ano começa logo à tarde, quando acordarem os nossos foliões (vindos de Jaguari).

CARNAVAL

a carne vai
ao vale
do jaguar
ooooooo e fica
aqui
o sossego
a alma da cidade
com os olhos
molhados de azul
e a garganta
cheia de pássaros
ooo
sem aval
da lei
a carne vai
ao vale
e vem
depois do carnaval

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

POEMA AZUL (E CINZA)


o domingo estava azul a tarde inteira como nunca foi neste verão mas um vento austral soprou o canto dos pássaros para longe e a tarde foi cinza porque os pássaros não cantaram a tarde inteira

BOAVENTURA II

A partir da constatação forçada de que o período é de transição, Boaventura de Souza Santos vê uma necessidade de "voltar às coisas simples". Uma delas consiste em fazer perguntas aparentemente ingênuas, como o fez Jean-Jacques Rousseau num momento em que se passava a produzir cientificamente, em meados do século XVIII. Aquele período também era de transição, a julgar pelo sociólogo. Rousseau retoma uma fórmula socrática ao perguntar se há relação entre ciência (sabedoria) e virtude, se o conhecimento é capaz de diminuir a distância entre o que se é e o que se aparenta ser, entre a teoria e a prática. Tais dicotomias sempre existiram, existem e continuarão a existir, independentemente se o período é de transição ou não. Aliás, a humanidade vive em constante transição desde que evoluiu da condição animal, passando ao jugo dos deuses e libertando-se deles. A resposta rousseaniana àquelas indagações é um "redondo não", o mesmo com que o pensador português (até que enfim, um pensador português!) diagnostica para os anos oitenta. Segundo ele, um momento de perplexidade, falta de "confiança epistemológica", "sensação de perda irreparável"... Perda do quê? A transição mais evidente, repito o que escrevi em postagem abaixo, apontava para o fim da guerra fria (com a débâcle soviética). As inovações tecnológicas propiciaram um enorme salto para a cibercultura. As descobertas genéticas, por exemplo, aproximam o conhecimento da vida, negando o discurso negativo e alarmista do sociólogo.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

EQUILIBRISTAS SOMOS

O passado e o futuro estão separados por uma corda (o presente), sobre a qual nos equilibramos. Ou caímos no vazio, ou tornaremos real o sonho de viver. Todo desequilíbrio é uma ameaça à travessia. De mãos dadas, não corremos risco.

BOAVENTURA DE SOUZA SANTOS

Alguns chavões retóricos revelam o catastrofismo de Boaventura de Souza Santos, sociólogo português, na introdução de seu Um discurso sobre as ciências. Prova-o as afirmações vagas do autor de que o século XXI "começa antes de começar" ou "termina antes de começar". Prova-o a relação forçada entre "os perigos cada vez mais verossímeis da catástrofe ecológica ou da guerra nuclear" e, de acordo com Boaventura, o "tempo de transição" em que vivemos no presente (há quinze anos do final do século XX). Em 1985, a única transição que o mundo experimentava era para o fim da guerra fria e da ameaça nuclear. Nesse ano, foi lançado na União Soviética o plano de transformação, denominado Glasnost e Perestroika, graças a Mikhail Gorbachev. Passados vinte e poucos anos, ainda não sofremos uma catástrofe ecológica em âmbito planetário. O aquescimento global poderá desencadeá-la futuramente. O século XXI iniciou-se exatamente na passagem do ano 2000 e terminará exatamente cem anos depois, com ou sem o relativismo interpretativo do sociólogo português.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

DEZ MIL VISITAS

Hoje é dia para comemorar as dez mil visitas ao meu blog. Estou feliz por esse motivo. Por outros, não. O sonho pode durar uma noite inteira, mas a realidade vem pela manhã. Sem sonho não há poesia e vice-versa. A cidade está triste dentro dos meus olhos.